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Fomento à Cultura no Brasil: uma crítica acadêmica

Marcus Pinto Aguiar[1]

Capa-Incentivo à Cultura no BrasilA Constituição Federal brasileira de 1988 dispõe, em seu artigo 215, sobre os deveres do Estado em matéria de cultura, quando afirma que ele “garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.”

Nesse sentido, a obrigação de garantir implica em uma conduta positiva dos agentes públicos, isto é, uma obrigação de fazer, no sentido de organizar e direcionar a estrutura pública para que todos possam igualmente dispor das condições necessárias para a realização de seus planos de vida, pois o exercício pleno dos direitos culturais é o caminho para garantir o direito à vida em sentido amplo, incluindo o desenvolvimento material, psíquico e espiritual que os bens culturais são capazes de proporcionar a todos.

Já em relação à obrigação de “apoiar e incentivar” a difusão das manifestações culturais, também se antevê uma obrigação de fazer da parte do Estado, de prover, direta ou indiretamente, os meios materiais necessários para a realização do direito à vida cultural, como referido anteriormente.

Assim, as obrigações estão claras, mas a forma como elas serão realizadas podem ser diversas, uma vez que, definir quais manifestações culturais devem ser financiadas e como será feito, tem sido o grande debate por meio do qual se questiona também o papel do Estado e da iniciativa privada, que, muitas vezes, estão de mãos dadas para satisfação apenas de interesses economicistas. Daí a importância sempre atual da participação popular democrática e autônoma na definição dos processos de financiamento da cultura e da transparência e apoio do Estado.

Nesse contexto, não se pode fechar os olhos diante da voracidade do mercado que se anima fundamentalmente pelo lucro e se desinteressa pelas atividades que podem dificultar a produtividade e a lucratividade. Questões que não necessariamente devam estar distantes das ações do Estado, desde que não sejam nem o seu motor nem o seu fim último, tanto por uma questão de escassez orçamentária, como por necessidade de priorização de suas políticas públicas, uma vez que a eficiência também é um princípio constitucional de animação e avaliação das ações estatais.

Desse modo, entre as formas de fomento da cultura, encontram-se a atividade direta ou indireta do Estado, por meio de incentivos fiscais, e as ações promovidas diretamente pelas instituições privadas. Por isso, nesse processo, cabem discussões sobre o que é cultura, o que deve ser preservado, qual o papel da influência ideológica do governo, e como deve ser a participação popular, entre outras.

O risco de mercantilização da cultura está sempre a rondar esses debates e não apenas por ações da iniciativa privada que geralmente pensa na expressão cultural como um produto de mercado; em difusão, como comercialização; e em valor, como receita financeira. O próprio Estado, entretanto, por meio da submissão da política às finanças, permite que as grandes corporações midiáticas sejam, muitas vezes, os tecelões de uma cultura nova e que, com seu alcance, desvaloriza o que a comunidade, com uma voz menos potente, aceita como sua própria.

O fomento à cultura exige do Estado investimentos não apenas para o acesso aos bens culturais, mas também para produção, manutenção e criação de expressões que reflitam autenticamente os interesses das comunidades, mais do que os do mercado, sem desmerecer as possibilidades de geração de emprego e renda, oportunidades de qualificação e o valor econômico da cultura.

Diante dessas perspectivas que envolvem o mundo da cultura e dos direitos culturais, o Instituto Brasileiro de Direitos Culturais – IBDCult – animado por sua missão institucional de promover estudos e ações voltados para os direitos culturais e as políticas culturais, apresenta a obra “Fomento à Cultura no Brasil”, sob selo editorial próprio, e organizada por Francisco Humberto Cunha Filho, Daniela Lima de Almeida e Cibelle Alexandre Uchoa, que tiveram o esmero de procurar referenciar questões que promovam a garantia, apoio e incentivo a uma vida cultural digna e plena para todos.

Entre os temas tratados nesse trabalho, estão: Lei Rouanet, Mecenato, FICART (Fundo de Investimento Cultural e Artístico), Sistema Nacional de Cultura, Credenciamento (como prática licitatória no âmbito cultural), Patrimônio Cultural Brasileiro, Tributação e Cultura, Ordem do Mérito Cultural e o Programa Nacional de Apoio à Cultura, Imunidade tributária e Fomento, Indústria Cultural, Lei Sarney, PROCULTURA, Políticas Públicas Culturais e Vale-cultura. Revelam, assim, a riqueza e diversidade da obra que tem também a intenção de se colocar como apoio importante para a promoção do debate em torno da temática do fomento à cultura brasileira.

A tônica dos trabalhos é a de não se acomodar com a descrição, ou seja, os autores e organizadores nitidamente não pretendem ofertar ao público cartilhas ou manuais de operação de institutos jurídicos de fomento à cultura, não obstante detalhá-los com adequada precisão seja a premissa comum e indispensável para análises críticas, tomada esta expressão no sentido acadêmico que deve ter. É bem verdade que tais análises não estão distante das polêmicas; ao contrário, até as instigam, mas para delas participar torna-se indispensável um manuseio personalíssimo da obra. Fica a recomendação.

[1]Presidente do Instituto Brasileiro de Direitos Culturais. Doutorando do PPG Direito da Universidade de Fortaleza – UNIFOR.

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6 Comentários para “Fomento à Cultura no Brasil: uma crítica acadêmica”

  1. Avatar Gleise Oliveira disse:

    Interessante recomendação de leitura. Se possível, gostaria de informações de como obter o livro. Tentei pelo site do IBDCult (http://www.ibdcult.org/), mas parece que não está atualizado. Agradecida.

    1. ODC ODC disse:

      Boa noite

      escreva para o Prof. Humberto Cunha humberto.3000@hotmail.com

      att
      José Marcio Barros

  2. Avatar Augusto César Costa disse:

    Como faço para adquirir um exemplar dessa obra?

    1. ODC ODC disse:

      Boa noite

      escreva para o Prof. Humberto Cunha humberto.3000@hotmail.com

      att
      José Marcio Barros

      1. Avatar Allan Calisto disse:

        Oi prof. José Marcio, quanto tempo, tudo bem!

        Tem algum lugar em Belo Horizonte que posso comprar este exemplar, ou somente por e-mail?

        Abs!

        1. ODC ODC disse:

          Olá Allan

          infelizmente não sei te informar. Peço que entre em contato com o Prof. Humberto Cunha pelo e-mail humberto.3000@hotmail.com

          att

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