“O sonho que acho mais fascinante é o de uma sociedade andrógina e sem gênero (embora não sem sexo) na qual a anatomia sexual de uma pessoa seja irrelevante para o que ela é, para o que ela faz e para a definição de com quem ela faz amor”
Gayle Rubin
Na última reflexão proposta aqui tivemos como foco o modo como diferenças implicam em desigualdades. Desigualdades de posições, mas também de forças na arena social. Hoje gostaria de comentar a morte de uma jovem de 15 anos, de cafêlandia, interior de São Paulo que morreu em decorrência do abuso desmedido do controle que seus pais julgavam ter sobre seu corpo e seus sentimentos.
Num contexto em que listas feministas comemoram a chegada de uma mulher ao cargo político mais importante do país e aproveitam também para aquecer as discussões em torno das principais bandeiras em torno dos direitos sexuais e reprodutivos, de equidade em oportunidades de trabalho e salários e, sobretudo, do direito de viverem livre de ameaças e violência somos surpreendidos com fatos como este.
A mim parece que estamos vivendo um enorme refluxo das conquistas feministas neste país, especialmente no que tange ao recrudescimento também político de nossa sociedade que compõe cada vez mais uma forte e crescente bancada religiosa nas câmaras e no senado. Bem, olhando por este lado pareço-me pessimista por demais. Mas quero poder pensar diferente, quero crer que a sensibilização da sociedade brasileira quanto aos custos da reprodução de nossas desigualdades ainda não foi o bastante. Quero crer que muitos homens e mulheres do nosso país ainda não tiveram a oportunidade de pensar o quanto estamos impregnados de machismos, sexismos e misoginias.
Há quem diga que o pai desta garota agiu de forma corretiva, por suas mentiras e por fim para protegê-la. Que tipo de cuidado permite a um homem espancar até a morte? Estou certa de que não fora a mentira tampouco a desobediência que levou a atitude de tamanha truculência. Mas certamente estamos diante de uma relação de abuso. Abuso de um poder que muitos pais, maridos e namorados julgam ter sobre os corpos de suas mulheres. Mais lamentável ainda é ter de reconhecer que fomos nós mesmo que demos a estes homens falso entendimento sobre si mesmos. Quando valorizamos sua força, sua virilidade, sua capacidade de cuidar e decidir podemos estar buscando complementaridades em nossos distintos desafios mundanos, mas de fato estamos reproduzindo falsas idéias do que devam ser homens e mulheres em nossa sociedade.
Quantas mulheres precisarão ser espancadas, seqüestradas, violentadas para compreendermos que a postura de cada um de nós precisa ser radicalmente modificada cotidianamente até que este imaginário esquizofrênico sobre a diferença de gênero não implique mais em desigualdades?
*Ana Laura Lobato é mestranda em Antropologia Social pela Universidade Estadual de Campinas (2008-2010) e Bacharel em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2007). Tem experiência na área de Antropologia Urbana e Sociologia, com ênfase em Gênero, sexualidade e Juventude.
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