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Duas perspectivas sobre diversidade cultural

A concepção da cultura e do seu papel nas esferas política e econômica foi paulatinamente mudando nos últimos anos. Também a noção de diversidade cultural tem sido pauta de debates internacionais há bastante tempo.

A diversidade cultural foi invocada pela primeira vez no contexto das relações entre cultura e desenvolvimento, definidas pela UNESCO no histórico Relatório Nossa Diversidade Criadora. Segundo este documento, a manutenção e promoção das diferentes culturas presentes no mundo é condição necessária ao desenvolvimento harmonioso das sociedades, através do respeito à democracia e à tolerância.

Um princípio básico deste enfoque sobre a diversidade é o respeito a todas as culturas, a incorporação das minorias nacionais, cujo desejo é de seguir sendo sociedades distintas em relação à cultura majoritária e dos grupos étnicos, que buscam por reconhecimento de sua identidade étnica, com instituições e leis mais permeáveis às diferenças culturais.

Numa acepção contemporânea, a diversidade cultural torna-se um mecanismo para manter a distinção das culturas nacionais diante do que é concebido como tendências gerais de homogeneização cultural da globalização. Este conceito, então, não reitera um regime de manutenção das diferenças a todo custo, mas possibilita a transformação produzida por misturas entre as culturas. Cabe indicar que a diversidade aqui tratada tanto se refere às relações entre os Estados, como também dentro deles. Desse modo, a diversidade articula-se com as idéias de democracia cultural e das novas formas de cidadania.

Nesta perspectiva, a diversidade cultural pode ser compreendida tanto como um modo de conseguir integração social, mas também um elemento das agendas das democracias culturais.

A outra dimensão da diversidade cultural que tem sido amplamente debatida é seu entendimento como um princípio representante das necessidades para um intercâmbio equilibrado de bens e serviços culturais entre Estados e culturas.

Esse enfoque tem como contexto uma mudança na economia mundial que, no século 21, está baseada, sobretudo, em conhecimentos tecnológicos e científicos, na informação, no aproveitamento dos conhecimentos tradicionais e também nas indústrias culturais.

Preocupações sobre a globalização, liberalização do mercado e diversidade cultural têm-se articulado no atual discurso político internacional. Essas preocupações têm origem e concentram-se principalmente no impacto das novas estruturas de governo internacional, desenvolvimentos tecnológicos e arranjos econômicos na organização e regulação da mídia audiovisual.

Atrelado a isso, a dificuldade em estabelecer regras para regulamentar o comércio de bens e serviços culturais é reflexo ainda da complicada diferenciação entre estes. A definição das atividades, bens e serviços culturais é fruto não somente de uma política cultural, mas também da alta dos valores desses no mercado. Os europeus afirmam que os negociadores dos Estados Unidos, do GATT e da OMC definiram os bens culturais (filmes, programas de televisão, gravação sonoras ou em vídeos, livros etc.) como mercadorias com o intuito de gerar cada vez mais lucros aos grandes conglomerados transnacionais do entretenimento.

Apesar da idéia de cultura não encaixar com facilidade nas categorias conceituais próprias da negociação comercial, sua definição em bens ou serviços tem importantes conseqüências econômicas e comerciais. Duas dessas conseqüências são bastante comuns quando se trata de diversidade cultural: uma refere-se à questão do acesso a mercados, o domínio exportador dos conglomerados da indústria cultural, a submissão dos países aos tratados internacionais e às formas de negociação do comércio de bens e serviços culturais ainda embrionários e discordantes sobre este tipo de “produto”. Outra conseqüência, mais relacionada ao campo político, diz respeito à possível ameaça que os produtos culturais estrangeiros trazem à identidade nacional.

É necessário, portanto, desenvolver os elos entre cultura e comércio (ou cultura e economia), favorecendo assim a forma dos países de intervirem em mercados culturais para promover a sustentabilidade da produção nacional, assim como de promoverem um intercâmbio equilibrado entre culturas. Nesses termos, é papel do Estado desenvolver políticas públicas necessárias para a preservação e a promoção da diversidade cultural.

*Giuliana Kauark é Mestre em Cultura e Sociedade (UFBA, 2009) e membro do Fórum Mundial U40 para a Diversidade Cultural. Atualmente é Diretora de Espaços Culturais da Fundação Cultural do Estado da Bahia e professora do curso de especialização EAD em Gestão Cultural do SENAC Bahia.

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