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Médico especialista em drogas é intimado a depor por apologia ao crime e declara “é uma ofensa à ciência”

Em setembro do ano passado, o médico Elisaldo Carlini foi surpreendido por uma correspondência: ele era alvo de um inquérito que investigava se havia feito apologia ao crime – sem especificar qual – e que estava sendo intimado a depor para prestar esclarecimentos.

Aos 87 anos, o professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), especializado em psicofarmacologia pela Universidade de Yale, nos Estados Unidos, é um dos principais pesquisadores de entorpecentes do país. Ele dedica-se há mais de seis décadas a estudar o efeito das drogas e, em especial, o uso medicinal da maconha, pelo qual advoga abertamente.

Elisaldo Carlini, médico acusado de apologia ao crime. Foto: Unifesp

“Quando recebi a carta, quase caí para trás. Não era possível que estava sendo acusado disso”, diz Carlini à BBC Brasil. “Em todos esses anos de trabalho, nunca havia me acontecido algo assim.”

A razão da intimação era seu trabalho como organizador da quinta edição de um simpósio sobre maconha e realizado em maio do ano passado, com a participação de mais de 30 especialistas de diferentes áreas, como política, história, direito e cultura, para discutir questões em torno da droga. O evento era patrocinado pela Unifesp e pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogras Psicotrópicas (Cebrid).

Em um dos painéis, sobre religião, Carlini gostaria de ter contado com a presença de Ras Geraldinho, como é conhecido Geraldo Antonio Baptista, criador da primeira igreja rastafári do país, que usa a maconha em rituais de meditação.

Baptista está preso desde 2013, condenado a 14 anos de reclusão por tráfico de drogas, após a apreensão de 37 pés da planta na sede de sua igreja, em uma chácara no interior de São Paulo. Carlini e seus colegas pediram, então, à Justiça que ele fosse autorizado a deixar a prisão temporariamente para participar do simpósio, o que foi negado.

Os cientistas seguiram com a organização do evento sem a participação de Baptista, mas o episódio não terminou ali.

Indignação e revolta

A promotora Rosemary Azevedo Porcelli da Silva, do Ministério Público Estadual de São Paulo (MPE-SP) em Campinas, que analisou o convite dos cientistas a Geraldinho, disse que o pedido lhe gerou “indignação” e que havia nele “fortes indícios de apologia ao crime”, como escreveu no documento que encaminhou a um promotor da capital soliticando que fossem tomadas as “providências cabíveis”.

O resultado foi a convocação de Carlini para depor no 16º DP, na zona sul de São Paulo – e o que ele fez, na última quarta-feira. Diante da escrivã, ao longo de uma hora, ele confirmou que havia feito o convite a Baptista, explicou as razões disso e o que era o simpósio e falou de sua carreira e do trabalho que desenvolve. Em nenhum momento lhe foi esclarecido qual seria seu crime.

“Sempre fui contra a condenação da maconha como uma droga perigosa. Ela é cada vez mais reconhecida como um bom medicamento e tem efeitos positivos amplamente descritos pela comunidade científica mundial, principalmente em casos de esclerose múltipla e epilepsia. Tenho que falar sobre o que eu acredito. Mas nunca falei uma palavra a favor ou contra o uso recreativo”, diz e conclui: “Qual foi meu crime? Posso ir para a cadeia por causa disso”.

Organizador do evento desde 1995, é a primeira vez que algo do tipo lhe acontece. “Fui condecorado duas vezes pela Presidência. Minhas pesquisas já foram citadas mais de 12 mil vezes por pesquisadores de todo o mundo. Coordeno um centro de pesquisa na área na Unifesp. Tudo sempre com um aspecto eminentemente científico”, diz Carlini.

“Senti uma revolta imensa, porque sempre pude falar dos efeitos positivos da maconha e nunca tive problemas. Isso é uma ofensa para a ciência brasileira.”

Fonte: BBC

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