O que pode um corpo, perguntava Spinoza lá no início da era moderna. Não sem razão foi (o corpo) o alvo principal das técnicas disciplinares e, posteriormente, como corpo coletivo, preocupação principal da sociedade de controle e suas biopolíticas. A resposta, a resistência sempre esteve presente, mas, de maneira geral, desvalorizada por uma visão pouco afetiva e efetiva da política que destinava às questões corporais o espaço do privado, do doméstico. Aí tem lugar o papel decisivo dos movimentos feministas, tanto em suas elaborações teóricas, quanto em suas práticas de luta e reivindicações, na politização do corpo e sua problematização nas esferas públicas
Stuart Hall, solicitado a fazer um percurso dos Estudos Culturais, reconhece o papel que as pensadoras feministas tiveram para descentrar ainda mais o sujeito cartesiano apontando as relações de poder específicas à questão de gênero, bem como o cruzamento destas com outros tipos de micro e macro poderes. Ora, as artistas estavam presentes nesse processo, que podemos situar com mais clareza por volta dos anos 1960. E recorrendo ao que naquele momento configuravam-se como as novas tecnologias a serviço de suas capacidades criativas e comunicativas, como o vídeo. No Brasil, Letícia Parente, em plena ditadura militar, se filmou bordando na planta de seu próprio pé com agulha, linha e sangue a mensagem: Made in Brazil.
Uma das pioneiras nesse uso artístico e político do vídeo, tendo o corpo como materialidade prima de suas obras, é a artistasaustríaca VALIE EXPORT, marca que Waltraud Lehner começou a usar em fins dos sessenta. Recentemente, se encerrou a primeira exposição individual desta artista de Viena no Brasil. Intitulada “VALIE EXPORT: CORPO = LINGUAGEM”, a mostra esteve entre os dias 6 de abril e 1º de maio no Centro de Arte Contemporânea e Fotografia, em Belo Horizonte.
A curadora responsável, Berta Sichel, reuniu um conjunto significativo de obras da artista que, como situa Sichel, “faz aparecer o corpo e o espaço em múltiplas formas e encarnações”, transformando o espaço urbano em sua arena e o vídeo em espaço alternativo. Também em Belo Horizonte, na FUNARTE, do dia 12 de abril até 12 de junho, a exposição da artista Milena Travassos, intitulada “Sala de Jejum”. Meio século depois, o corpo e o vídeo continuam se misturando como possibilidade de resistência política. Mas se na década de 1960, o dado político era mais explícito, como afirmação de uma posição, hoje ele é mais poético. Travassos, uma artista que inicia sua produção no novo milênio, recorre a um texto de Benjamin, Sala de Desjejum, para conceituar e nomear sua mostra.
Trata-se daquele momento, no texto do filósofo e nas obras da artista, em que já acordados, não estamos ainda despertos, e nos encontramos em um “entre”, um limiar entre sonho e realidade. Como situa Travassos, sua obra é “composta por vídeos e vídeo-instalações que evidenciam um interesse do corpo em cena, dos pequenos gestos, das paisagens abertas, da imagem”.
Milena Travassos traz o corpo para o círculo de sortilégio do sonho, não por medo dos homens, nem, talvez, por amor ao recolhimento anterior, mas pela força poético-política da capacidade de fabular contra o deserto do real.
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