NOTÍCIAS

Oportunidade de desenvolvimento

 

A questão ambiental vista como oportunidade e não como problema

 

 

Membro do Conselho Fiscal da Fundação Biodiversitas, o engenheiro eletrônico e economista Leonardo Fares ressalta que o atual cenário, no que se refere ao desenvolvimento sustentável, embora marcado pela crescente conscientização por parte das empresas e sociedade, sofre as conseqüências destrutivas da resistência dos países em assumir acordos e dos elevados padrões de consumo que impactam negativamente a vida no planeta.

Com a aproximação da Rio + 20, que será realizada de 16 a 20 de junho no Rio de Janeiro, o empresário do segmento de software e serviços para os setores de energia elétrica e aeroespacial chama a atenção para a necessária mudança de paradigma em relação à questão ambiental que deve ser vista como oportunidade e não como problema.

Nesta entrevista ao ODC, ele destaca ainda desafios, em várias áreas, que exigem uma visão integrada para potencialização dos recursos regionais e culturais, bem como geração de renda e emprego, em sintonia com as demandas ambientais. A trajetória de Fares, como militante ambiental, inclui a atuação como sócio fundador da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA); membro da Câmara de Atividades Industrias (COPAM), do Conselho Municipal de Meio Ambiente de BH (COMAM) e do Conselho Curador da Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM).

ODC: Como avalia a evolução das condições do clima planetário, como, por exemplo, a questão do buraco da camada de ozônio?

Leonardo Fares: Aqui cabem duas visões: do ponto de vista de emissões de gases de efeito estufa e perda de biodiversidade a situação piorou, pois os acordos assumidos pelos países signatários não foram cumpridos. O Japão e os países europeus fizeram esforços importantes, porém, insuficientes. Agravando o cenário está a posição dos Estados Unidos que não assumiram nenhum compromisso em relação ao tema. A China, embora não obrigada a compromissos, vem fazendo um esforço notável na área de energias limpas e de proteção à biodiversidade. O Brasil, também, não obrigado a assumir metas, definiu a sua própria, relativa à redução do desmatamento da Amazônia, e está cumprindo. Infelizmente, o que resultou de tudo isso foi o aumento da emissão de gases de efeito estufa, com a consequente elevação da temperatura do planeta e o aumento da destruição de biodiversidade global.

 

Do ponto de vista da mobilização e conscientização de governos, sociedade civil e empresas, houve uma evolução sensível, principalmente, nos dois últimos. Mais do que conscientizar-se e mobilizar-se, sociedade civil e empresas estão tomando ações inovadoras com impactos positivos para o clima planetário. Elas evoluíram muito mais do que os governos nestes 20 anos. Talvez essa tendência seja o motor das mudanças futuras.

ODC: Quais os principais avanços e recuos e a perspectiva, com a Rio + 20, em relação ao desenvolvimento sustentável global?

LF: O que de fato mudou foi o nível de percepção e sensibilização do problema. As pessoas estão mais interessadas no assunto e dispostas a contribuir no dia-a-dia para um novo cenário. Por um lado, percebe-se que formas alternativas e renováveis de geração de energia ganharam escala comercial, quando, em 1992, não passavam de experimentos considerados até poéticos. Por outro lado, padrões de consumo tradicionais, fortemente impactantes, permanecem inalterados, com destaque para o transporte individual; a produção de petróleo em franca expansão e modelos de produção fortemente retrógados são ainda muito robustos, a exemplo do que assistimos na discussão do código florestal.

ODC: Cientistas reunidos na conferência Planeta sob Pressão, realizada em abril, apontaram o crescimento populacional e o estilo de vida – uso das tecnologias e diminuição do consumo etc – como principais obstáculos. Como poderemos tratar essa questão, para além da dimensão econômica, tendo como eixo a diversidade das culturas?

LF: No meu ponto de vista, é preciso, antes de mais nada, mudar o paradigma de que a questão ambiental é um problema, para o de que, na verdade, trata-se de uma enorme oportunidade. A percepção da questão ambiental pelas empresas, governos e sociedade está ainda muito fracionada, o que não permite, muitas vezes, apreender um conjunto de oportunidades ainda fora do campo de visão, principalmente, das empresas e governos.

Resumidamente, as visões têm sido as seguintes: Para a sociedade, um problema que causa danos à qualidade de vida, especialmente à saúde. Numa visão mais estratégica, este problema compromete, inclusive, a sobrevivência do “modus operandi” das sociedades humanas da forma como estão hoje organizadas. Para os governos, um problema sob crescente atenção social que demanda um marco regulatório eficiente e um aparato público de licenciamento e fiscalização. De modo geral, a questão tem sido tratada como um problema que demanda um eficiente sistema de gestão e a construção e operação deste sistema tem sido o grande desafio. Para as empresas: neste caso, há visões mais atrasadas que enxergam a questão ambiental como um empecilho ao desenvolvimento e outras mais avançadas que já conseguem enxergar a questão como um fator de produtividade e competitividade. De toda forma, a visão ainda é associada a um problema.

Independentemente das visões correntes, a variável ambiental está provocando uma mudança radical em padrões de percepção da realidade, em quase todas as partes do mundo. Novos marcos regulatórios estão em desenvolvimento, a percepção dos consumidores e cidadãos está em processo de rápida mudança e, consequentemente, a sociedade como um todo vai se adaptando a esta nova realidade. Juntamente com ela, surgem as oportunidades empresariais.

ODC – Quais os principais desafios e em quais áreas?

LF – No design industrial, o compromisso de dar adequada destinação final aos bens de consumo, associado ao princípio da re-usabilidade, está criando novos padrões no design industrial com o objetivo de garantir que os produtos sejam projetados e construídos dentro de critérios que permitam o  desmonte e re-uso de partes e peças ao término de sua vida útil. Este conceito aplicado nas cadeias produtivas pode representar um notável incremento na produtividade e competitividade da indústria.

Novos materiais: pelas mesmas razões anteriores, outra oportunidade em franca expansão é o desenvolvimento de novos materiais, de origem sintética ou não. No campo empresarial, algumas tendências são observáveis. Na engenharia de processos: este é um segmento em franca evolução, considerando-se que o controle ambiental da indústria está diretamente relacionado com a redução da geração de resíduos. Existe hoje um forte esforço científico e tecnológico nesta direção, grande parte dele na revisão dos processos industriais existentes e mesmo na criação de novos.

Quanto à indústria de controle de emissões: já diretamente no campo industrial surge um forte segmento voltado, exclusivamente, para produção de equipamentos de controle de efluentes. Trata-se de um segmento com demanda global e de forte conteúdo tecnológico. Em relação à biodiversidade: seguramente é o maior patrimônio natural brasileiro, uma ou duas ordens de grandeza superior aos normalmente citados, tais como as reservas de petróleo e gás, minerais ou do potencial hidrelétrico. No entanto, não temos hoje, absolutamente, nenhuma política estruturante para a área.

Outro desafio, a energia: aproximadamente 87% da energia consumida hoje no planeta é proveniente de fontes não renováveis. O fenômeno do aquecimento global traz oportunidades inéditas no campo das energias renováveis. Talvez este seja um dos poucos campos onde já existem ações articuladas de políticas públicas, ainda assim, tímidas e localizadas.

Em relação ao seqüestro de carbono: diretamente associado ao item anterior, o Brasil vem perdendo terreno para os países asiáticos na implementação dos mecanismos do Protocolo de Kyoto. Embora no âmbito do nosso estado haja iniciativas nesse sentido, estas estão aquém para atender o leque de oportunidades no segmento. Já na agricultura, de acordo com o relatório de 2005 da International Federation of Organic Agriculture Movement mais de 26 milhões de hectares em todo o mundo estão certificados como produtores de agricultura orgânica, que geraram em 2003 um faturamento superior a US$25 bilhões.

Como se observa, as oportunidades estão presentes em várias áreas. Uma visão integrada pode potencializar os recursos de cada região, de cada cultura, no sentido de gerar renda e emprego de forma alinhada com as demandas ambientais do planeta. Para isso, a questão ambiental tem de ser entendida como oportunidade e não como problema. Esta visão tem se manifestado de forma esparsa em alguns países, tendo a Alemanha como grande destaque. O Brasil, infelizmente, ainda não dedicou a devida atenção ao tema e, consequentemente, não o incorporou nos seus planos de desenvolvimento econômico e social.

Deixe aqui o seu comentario

Todos os campos devem ser preenchidos. Seu e-mail não será publicado.

ACONTECE

Chamada para publicação – Boletim 101, N. 01/2024

CHAMADA PARA PUBLICAÇÃO – Boletim 101, nº 01/2024 Cultura Viva: 20 anos de uma política de base comunitária  Período para submissão: 13 de março a 23 de junho de 2024   A Revista Boletim Observatório da Diversidade Cultural propõe, para sua 101ª edição, uma reflexão sobre a trajetória de 20 anos do Programa Cultura Viva […]

CURSOS E OFICINAS

Gestão Cultural para Lideranças Comunitárias – Online

O Observatório da Diversidade Cultural, por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte, patrocínio do Instituto Unimed, realiza o ciclo de formação GESTÃO CULTURAL PARA LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS. Período de realização: 10, 17 e 24 de outubro de 2024 Horário: Encontros online às quintas-feiras, de 19 às 21h00 Carga horária total: 6 […]

Mais cursos