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Rio + 20 e a cultura como pilar do desenvolvimento

Por que a cultura deve ser considerada o 4º eixo para a construção de um modelo de desenvolvimento global

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (UNCSD), também conhecida como Rio +20, adota três pilares
– social, meio ambiente e economia – para refletir sobre a construção de um modelo de desenvolvimento sustentável. A conferência será realizada no Rio de Janeiro de 20 a 22 de junho deste ano. O colaborador do ODC, membro do Fórum Mundial U40 e coordenador de projetos culturais do Santander Brasil, Piatã Stoklos, explica por que a cultura deve ser considerada o 4º eixo para a construção de um modelo de desenvolvimento global.

Stoklos está envolvido com dois projetos patrocinados pelo banco Santander no Brasil que poderão ser apresentados no evento: o Museu do Amanhã, que será inaugurado no Porto Maravilha, no Rio de Janeiro, em 2014, para tratar sobre cultura mundial e sustentabilidade; e o projeto Criaticidades, que apresenta referências sobre os conceitos de economia criativa, indústrias criativas, empreendedorismo criativo e cidades criativas, visando o fomento do desenvolvimento e fortalecimento das cidades.

O Fórum Mundial U40 é uma rede concebida e coordenada pela Comissão Alemã para a UNESCO em conjunto com a Federação Internacional das Coalizões sobre a Diversidade Cultural (IFCCD). É formada por mais de 50 profissionais e pesquisadores da área da cultura com até 40 anos de idade, de mais de 30 países de todos os continentes e tem como objetivo contribuir com as discussões e a implementação da Convenção da UNESCO sobre a Proteção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais.

 

ODC – Por que é necessário, na atual configuração geopolítica, considerar a cultura como pilar do desenvolvimento sustentável?

 

Piatã Stoklos  – Há uma série de razões que justificam a consideração da cultura como 4º pilar do desenvolvimento sustentável.  O tema do desenvolvimento sustentável surgiu a partir da percepção de que o desenvolvimento econômico, aliado às novas configurações mundiais advindas dos processos de globalização do século XX, precisavam ser repensados a partir da noção de que este novo quadro estaria gerando impactos ambientais, acarretando, por exemplo, em diminuição da nossa diversidade biológica, além de outros impactos diversos e consequentes do mesmo. O questionamento trouxe então à tona que, além de devermos considerar um desenvolvimento que protegesse e respeitasse o meio ambiente, a natureza, deveríamos também nos desenvolver de maneira que gerássemos igualdade de acesso e benefício para todos, ao invés de somente para poucas classes e atores sociais. Teríamos até aí os pilares da eficiência econômica, proteção ambiental e justiça social. Na esteira desta discussão, no contexto da década de desenvolvimento e cultura da UNESCO, entre os anos de 1988 e 1997, liderada por Jávier Perez de Cuéllar, ex-diretor geral da ONU, passa-se a enfatizar a importância do papel da cultura na discussão sobre a noção e as prioridades estratégicas de desenvolvimento dos países.

 

ODC – Nessa perspectiva, como a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural  trata do assunto?

 

PS – Em 2001, a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, afirma que “a diversidade cultural é tão necessária para a humanidade como a biodiversidade é para a natureza”, traduzindo a conexão do tema cultura com a do meio ambiente, no sentido de pensarmos qual o mundo que queremos ter e perpetuar. A importância da inclusão da cultura nesta discussão se dá primeiramente pelo entendimento de “futuro”. Cada povo, comunidade, cada país ou cultura tem um entendimento próprio de “futuro”, ou seja, daquilo que vem, de desenvolvimento, de onde queremos chegar. O relatório Nossa Diversidade Criadora, resultado desta década de trabalho da UNESCO, indica que podemos ter diversos modelos de desenvolvimento, o que de certa forma poderíamos dizer, hoje, que existem tantas formas de se desenvolver quanta diversidade cultural temos no mundo. A cultura tem, portanto, este papel, trazer os valores para a mesa, reafirmar que existem diferentes significados sobre os significantes que criamos, ou seja, diferentes interpretações sobre o mundo, diferentes olhares e cada um deles nos leva em direção a um futuro. Valorizar esta diversidade é uma forma de valorizarmos a criatividade e de enriquecer nosso debate em torno de que mundo queremos e como devemos construí-lo. Isto significa dizer que visitar e reconhecer os nossos valores, a nossa história, os nossos costumes, é fundamental para tomarmos decisões sobre o modelo de desenvolvimento que queremos afirmar.


ODC – No contexto das relações interculturais, como essa premissa do desenvolvimento deve ser efetivada?

 

PS – A cultura tem o poder de transpor fronteiras. Os Guarani, por exemplo, não são brasileiros, paraguaios, uruguaios ou de outros países, mas são deles também e de nenhum ao mesmo tempo. O que os identifica é um modo de ser, são valores, jeitos de ser e fazer as coisas. Poderíamos dizer o mesmo sobre judeus que estão espalhados em todo o mundo ou ainda sobre a cultura japonesa ou outros povos que também se dispersaram pelo mundo e que mantiveram consigo as suas raízes. Além disso, a linguagem artística, como a música, as artes plásticas, por exemplo, são expressões que dialogam com diferentes culturasindependente, muitas vezes, do idioma e da história de cada povo. Esta é mais uma oportunidade do campo da cultura e das artes sobre como estabelecer conexões mais fortes em nossas relações interculturais.

 

ODC – Como as relações interculturais contribuem nesse contexto?

 

PS – Em muitas situações as expressões artísticas nos ajudam a abrir portas e a facilitar o diálogo e a busca por consensos. Podem ajudar a flexibilizar as relações, a colocar de lado as posturas defensivas e a identificar o positivo e a humanidade em cada povo.
De qualquer forma, no que diz respeito a instrumentos de relações internacionais, todos os acordos e instâncias são oportunidades para que se evoque tanto a Convenção sobre a Diversidade Cultural, especialmente para os países que a ratificaram e que, portanto, passaram a ter o seu texto no seu quadro legal, quanto outros documentos referenciais, como a Declaração sobre a Diversidade Cultural, o Relatório de Desenvolvimento do PNUD (especialmente o de 2004, que trata sobre liberdades culturais) e o próprio documento Nossa Diversidade Criadora, citado anteriormente. Diversos contextos podem ser oportunos para se tratar a cultura como 4º pilar para o desenvolvimento, desde assuntos relativos a resolução de conflitos, passando por relações comerciais, firmadas no âmbito da OMC, até modelos de programas de desenvolvimento implementados nos países entendidos como menos desenvolvidos.

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