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As mulheres na pauta do Congresso Nacional

Entre fevereiro de 2019 e fevereiro de 2020, foram apresentados 289 Projetos de Lei no Congresso Nacional, que se somam a outras centenas de projetos que ainda tramitam ou que já prescreveram, tratando de questões ligadas aos direitos das mulheres. Resta saber até que ponto esse conjunto tão extenso pode impactar na efetividade da igualdade de gênero, uma das dimensões centrais da convenção sobre a proteção e promoção da diversidade das expressões culturais.

As pautas de igualdade de direitos para as mulheres são antigas, alcançando movimentos que vão muito antes do final do século XIX, já objeto de discussões e reflexões acadêmicas, políticas e sociais. Em 2020, a Organização das Nações Unidas definiu para a campanha da ONU Mulheres o tema “Eu sou a Geração Igualdade: concretizar os direitos das mulheres”. No Brasil, o movimento nacional de articulação e organização das manifestações do dia 8 de março, elegeu “Por nossas vidas, democracia e direitos! Justiça para Marielle, Claudias e Dandaras!”. É inegável a dimensão política e a busca pelos direitos e pela justiça social.

Este ano a Declaração de Pequim, resultado da Conferência Mundial sobre as Mulheres de 1995, completa 25 anos. Um dos objetivos centrais desse documento era induzir, nos países membros das Nações Unidas,  legislações e políticas públicas voltadas para os direitos das mulheres, com base em doze áreas prioritárias, como a desigualdade no acesso aos serviços de saúde, a violência contra a mulher, a desigualdade em relação à participação no poder político e nas instâncias decisórias e as desigualdades estruturais com relação à renda e cargos gerenciais ocupados por mulheres, por exemplo.

Duas décadas e meia depois, as mulheres ainda lutam por direitos básicos e para que suas lutas se institucionalizem em forma de leis. Mas como pensar isso em um país como o Brasil, que possui apenas 15% de mulheres na Câmara dos Deputados e 13% no Senado Federal?

Uma rápida análise dos 289 projetos de lei atualmente em tramitação no Congresso Nacional, (disponíveis no link https://docs.google.com/spreadsheets/d/1ytqIEx4zJPApOcLsTATj363s5xd8baY49FplHhgL6EQ/edit?usp=sharing), revela que 39% deles foi apresentado por mulheres. Mas, questão é: o grande número de PL’s expressa as reivindicações dos movimentos das mulheres?

Do total, 105 (36%) tratam da questão da Violência Doméstica e outros 63 (22% do total) sobre Violência Geral contra a mulher, totalizando 60% dos PL’s referentes a apenas um dos doze temas propostos na Declaração de Pequim. Isso mostra o grau de exposição a que as mulheres se encontram, mesmo com todos os avanços conquistados. Por sua vez, 61 projetos (21% do total) tratam de questões da Saúde da Mulher e 35 (12% do total) são voltados para a Promoção da Igualdade entre mulher e homem, sendo dez voltados à participação das mulheres no legislativo.

Diversos parlamentares, das mais diferentes correntes ideológicas propõem acréscimo de dispositivos na Lei Maria da Penha (criada para coibir a violência contra a mulher). Em alguns casos, entretanto, as propostas são reativas, que não atacam a dimensão estrutural do preconceito e da violência contra as mulheres. Alguns exemplos são os PL’s que autorizam o porte de arma de fogo, o ensino de luta corporal para mulheres nas escolas públicas e a oferta de spray de pimenta e  armas de eletrochoque para a proteção pessoal das mulheres.

Há propostas que tratam da obrigatoriedade de o Estado criar estruturas específicas de apoio às mulheres, como a criação das “Patrulhas Maria da Penha” ou a criação/ampliação das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher.

Do total, 14 (5%) aqui definidos como “Outros” propõem a Denominação de Viaduto com nome de mulher a uma BR no nordeste do país, ou a inscrição do nome de uma professora no Livro dos Heróis da Pátria, entre outros. Apenas 7 PL’s (2% do total) referem-se à geração de emprego e renda para a mulher e 4 (1,5% do total) tratam de assédio (com o particular que um deles prevê diminuição da pena para o assediador de cinco para três anos).

Com relação aos impactos nos direitos, 212 PL’s preveem ampliação dos direitos sobre os temas que tratam, e 13 incluem direitos. Porém, 44 PL’s não tem previsão de impacto nos direitos (nem ampliam, nem incluem, nem restringem). Curiosamente, 6 projetos preveem restringir direitos, especialmente a criminalização do aborto.

Entre 2019 e 2020, foram apresentados 8 projetos de decreto legislativo (instrumento do legislativo para suspender atos que extrapolam as atribuições do poder executivo) de forma a cancelar portarias e decretos considerados lesivos aos direitos das mulheres. Outros 18, propõe monitoramento eletrônico de agressores de mulheres ou sua prisão imediata quando da ocorrência registrada e 17 PLs que propõem a vedação de nomeação em cargos públicos para condenados por violência contra a mulher.

No geral, nenhuma das ações propostas nos PLs tramitando no congresso conseguem atender às quatro recomendações propositivas que são feitas pela UNESCO para promover a igualdade de gênero, que deveriam ser monitoradas para, quais sejam: a) Integrar a perspectiva de gênero em todas as políticas e medidas culturais, b) Aumentar a disponibilidade e a qualidade dos dados desagregados por sexo, c) Garantir a igualdade de acesso a financiamentos e oportunidades e d) Apoiar as mulheres como criadoras e produtoras de expressões culturais contemporâneas.

Estatísticas do próprio governo federal revelam que, no Brasil, a cada 4 minutos uma mulher é vítima de violência. Apesar de terem um desempenho na educação superior ao dos homens, a renda das mulheres brasileiras é 43% menor, como revelou o Relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), de 2018.

As propostas de PL’s em tramitação, sem considerar outros mais de 20 Projetos de Emenda Constitucional (PECs), expressam a realidade da sub-representação feminina na política e a necessidade de ainda se buscar as garantias básicas de direitos e justiça social para as mulheres. 

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