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Mulher, corpo plural

Moldados pela indústria da beleza, os corpos das mulheres refletem estereótipos que sustentam clichês midiáticos, enraizados na vida cultural. Como uma construção histórica, o corpo feminino remete ao ideal grego, berço da civilização ocidental, de perfeição ligada à representação de beleza, carregando a influência marcante do cristianismo que o associou à fonte de pecado. Na Idade Média, o corpo serviu para distinção de hierarquias, conforme a altura, cor de pele ou peso, características físicas associadas a funções sociais. O período é lembrado pela caça às mulheres acusadas de bruxaria.

A ideia central da bruxaria era a de que o demônio procurava fazer mal aos homens para se apropriar das suas almas. E isto era feito essencialmente através do corpo e esse domínio seria efetuado através da sexualidade (BARBOSA et al., 2011, p.27).

No século XV, durante o período renascentista, a técnica opera como instrumento, de modo racionalizado e controlável, conforme códigos genéticos. Entre os séculos XVIII e XIX, com o saber assumindo papel de destaque na sociedade, o modelo de diferenciação sexual e, no século XX, as novas tecnologias são fundamentais na homogeneização de produtos e estetização de comportamentos. A adesão do imaginário feminino ao mito da beleza, na década de 1980, incentivará a partir de então, cada vez mais, as práticas de antipeso e antienvelhecimento, assim como de cirurgias estéticas.

Alvos de mecanismos de repressão e controle, os corpos femininos refletem a estratégia política de manutenção das relações desiguais de poder entre homens e mulheres. Com a conquista crescente de espaços de representatividade e poder pelas mulheres, intensificam-se, por outro lado, as normativas estéticas associadas a padrões de beleza, imperfeição moral, pertencimento de raça, classe e gênero. Crescem os índices de transtornos alimentares e a obsessão com o físico, as práticas de gordofobia, racismo, homofobia, preconceito em relação a vertentes de deficiência e perseguição a grupos  feministas.

Body Positive

Quem ganha a batalha no coração dos incautos? Certamente, as mídias, pois as imagens, que elas incessantemente passam, dão robustez ao imaginário que alimenta as miragens do ego. (SANTAELLA, 2008, p. 125).

Em reação a esse contexto contrário à diversidade das expressões ligadas ao corpo feminino, movimentos ciberativistas como o Body Positive ocupam o espaço midiático com o objetivo de desconstruir padrões dominantes opressores. Criado no instagram @effyourbeautystandards, pela modelo Tess Holliday, em 2012, o Body Positive visa promover a auto aceitação e valorização de pessoas cujos corpos são marginalizados pelos padrões estéticos.

O movimento levanta bandeiras que confrontam abordagem excludente característica de práticas discriminatórias, como a homofobia, racismo, preconceito contra deficientes, entre outros grupos sociais marginalizados.

O Body Positive recebe críticas quanto à defesa de uma visão do corpo que normalizaria a obesidade, ao enfatizar a padronização, sem considerar a importância das condições de saúde. Outra questão é o reducionismo associado ao aspecto estético, que descartaria as dificuldades estruturais e de acesso social por gordos maiores. Essa é a perspectiva de Evette Dionne em “The Fragility of Body Positivity: How a Radical Movement Lost Its Way”. A autora aponta o avanço do mercado da moda no quanto à inclusão social, em contraponto ao tratamento dos corpos marginalizados, por instituições como a mídia, escolas, sistema judiciário e habitações sociais.

Criado por Alexandra Gurgel, em 2015, o Canal Alexandrinos exemplifica a atuação do movimento no Brasil, nas redes sociais youtube e instagram. O espaço virtual de discussão sobre o Body Positive aborda ainda a atuação pública de celebridades, a partir de acontecimentos, para criticar a padronização da beleza feminina. Para a ciberativista, considerada a principal porta voz do movimento no país, ao desconstruir padrões estéticos, o Canal não se caracteriza como um movimento narcisista, mas, principalmente, de auto aceitação e mudança de olhar sobre o outro.

O que os canais ligados ao movimento atuante nas redes sociais pretendem é, sobretudo, transformar a vida das mulheres fora do mundo virtual, ou que questionem as noções de beleza, naturalizadas na forma de padrões estéticos, para os quais a diversidade de corpos femininos precisa, definitivamente, dar as costas.

Visite alguns canais do movimento Body Positive no Brasil:

“Ju Romano”, de Juliana Romano no Youtube: https://www.youtube.com/channel/UC98OXziBFGRga3tQgUCOgcw/videos?view=0&sort=da&flow=grid

“Femme Fatale by Jeh”, de Jéssica Lopes: https://www.youtube.com/user/JehLopesFemmeFatale/videos?view=0&sort=dd&flow=grid

“Alexandrismos”, de Alexandra Gurgel: https://www.youtube.com/channel/UC2LQ5jMieMZjb5k5Gprp2JQ

Para ler:

BARBOSA, Maria Raquel.; MATOS, Paula Mena; COSTA, Maria Emília. Um olhar sobre o corpo: O corpo ontem e hoje. Universidade do Porto, 2011. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v23n1/a04v23n1.pd. Acesso em: 20 nov. 2019.

SANTAELLA, L.; NÖTH, W. Imagem, cognição, semiótica, mídia. São Paulo: Iluminuras, 1998.

SANTAELLA, Lucia. Corpo e comunicação: sintoma da cultura, 3ª ed.São Paulo: Paulus, 2008.

DRUMOND, Débora; Senhorito, Thales. Alexandrismo: ativismo on line na desconstrução do corpo padronizado através do movimento body positive, 2019. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Jornalismo da Faculdade de Comunicação e Artes PUC Minas como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Jornalismo.

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