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VII Seminário da Diversidade Cultural: confira a cobertura do evento

A importância da dimensão estética no agenciamento dos movimentos sociais foi enfatizada nas discussões

A importância da dimensão estética no agenciamento dos movimentos sociais foi enfatizada nas discussões

VII Seminário da Diversidade Cultural, realizado de 21 a 23 de maio, reuniu um total de 200 participantes, no Memorial Minas Vale. A programação foi integrada por minicursos, palestras e debates.  Em pauta, a diversidade no contexto das mobilizações sociais, atuação da mídia, transformações do espaço público, subjetividade, setor audiovisual e convenção da UNESCO na atualidade.

Acompanhe a seguir os principais aspectos abordados durante os debates: 

Audiovisual na América Latina

Professores Vera França, Luiz Albornoz, Daniele Canedo e Maria Luisa Mendonça debatem diversidade  e setor audiovisual na América Latina

Professores Regina Mota, Luiz Albornoz, Daniele Canedo e Maria Luisa Mendonça debatem diversidade e setor audiovisual na América Latina

No dia 21, a diversidade cultural foi discutida no campo da produção e distribuição de conteúdo audiovisual na América Latina. Regina Mota (UFMG) abordou o tema na perspectiva das relações de alteridade que devem nortear o olhar sobre a diversidade das expressões, na medida em que concentram o desafio da constituição de si em relação com o outro, sem o que a noção de diversidade perde o sentido. A necessidade de satisfação quanto ao pertencimento, nas relações contemporâneas, requer pensar a diversidade, de acordo com Mota, no ambiente das práticas midiatizadas e, dessa forma, a produção de sentido por meio de dispositivos audiovisuais deve ser problematizada: estaria a produção audiovisual crescente promovendo, no cotidiano, mais a igualdade que busca o pertencimento do que a diversidade das expressões? Estaria, portanto, servindo mais à intolerância do que ao respeito, abertura, interesse pelo outro? Para além da presença tolerada, a alteridade implica a possibilidade da admiração de quem me parece desigual, diferente; daquilo que não convém, historicamente, ao processo de homogeneização dos hábitos, valores e comportamentos comumente associados à lógica do mercado, conforme defendeu.

Maria Luisa Mendonça (Universidade Federal de Goiás) analisou a questão no plano das representações das mídias, lembrando os estereótipos historicamente divulgados pelos meios de comunicação, que não reconhecem as transformações sociais e reproduzem modelos autoritários, tais como relacionados à velhice, por exemplo, cujas expressões diversas não recebem visibilidade midiática. Assim, essas pessoas são apresentadas por meio de padrões de comportamento e valores ligados à fragilidade de sua condição física, ou docilidade nas relações sociais. A pesquisadora identifica no campo das mídias sociais, no entanto, a possibilidade de iniciativas de autorrepresentação capazes de expressar “as múltiplas faces do indivíduo”, de romper, como lembrou, ao citar o educador Paulo Freire, a “cultura do silêncio” que não implica apenas falar, mas “não permanecer nas falas hegemônicas”.

Luiz Albornoz (UC3M – Madri, Espanha) debateu a diversidade cultural no contexto das boas práticas e indicadores na área e, especialmente, no ambiente das tecnologias digitais que, conforme alertou, aponta o risco do peso dos agentes corporativos típicos desse meio comunicacional, “intermediários digitais” que atuam, de forma marcante, na “Hollyweb”, a exemplo do sistema Google de busca e do processo de etiquetagem de conteúdos. Esses atores detêm interesses econômicos e políticos e organizam a informação conforme lógicas de produção e circulação de conteúdos, bem como de mecanismos de visibilidade próprios. Facebook e Youtube exemplificam domínios de conglomerados midiáticos que modelam o funcionamento nas redes digitais, promovendo produtos vendáveis, por meio da lógica colaborativa de produção e distribuição de dados e informações, agenciada pela atuação dos internautas.

Ao discorrer sobre as experiências das políticas cinematográficas regionais na América Latina, Daniele Canedo (Universidade Federal de Sergipe) relatou que, a partir de 2006, os documentos das regiões ibero e latino-americanas enfatizam a promoção e proteção da diversidade cultural. As dimensões cultural, econômica e tecnológica do cinema foram tratadas, assim, como fatores que garantiam a legitimidade e a necessidade do processo de integração cinematográfica. Porém, segundo ela, há ainda significativa distância entre discursos e ações implementadas, principalmente, quanto ao impacto econômico e apropriação tecnológica na cadeia produtiva do cinema regional.

Canedo destacou as contribuições dessas políticas para a integração do espaço cinematográfico regional, como os modelos de governança vertical e horizontal que resultam na constituição de redes formais e informais, bem como a contribuição de estratégias de políticas públicas inovadoras na esfera regional. No entanto, essas políticas, como explicou, têm capacidade restrita de produzir impacto econômico e tecnológico no mercado cinematográfico ou de gerar fluxos intrarregionais que limitem os fluxos extrarregionais da indústria hegemônica de Hollywood.

Movimentos sociais e cidade

Natacha Rena, Eduardo de Jesus, Bruno Cava e Fábio Mailini: movimentos sociais, estética e ativismo em rede

Natacha Rena, Eduardo de Jesus, Bruno Cava e Fábio Mailini: movimentos sociais, estética e ativismo em rede

No dia 22, Natacha Rena (UFMG), Bruno Cava (Universidade Nômade) e Fábio Malini discutiram o cenário atual dos movimentos sociais, protestos e ocupações urbanas e digitais em crescimento no Brasil e no mundo. Multidão e táticas estéticas acionadas no espaço entre redes e ruas; autonomia, subjetivação e formas de resistência em rede foram os eixos do debate, mediado por Eduardo de Jesus.  A “potência da multidão”, expressão utilizada por Natacha Rena, ao se referir às manifestações de protesto em junho de 2013, diz respeito a situações que produziram novos percursos e derivas pelas cidades brasileiras, conforme a professora. Ela destacou ainda as ocupações urbanas contemporâneas como acontecimentos marcados pela dimensão estética das expressões culturais: “A estética tem a condição de fazer a diáspora da informação”.

Práticas de ativismo urbanas ancoram-se em uma subjetividade construída em rede, defendeu Bruno Cava (Universidade Nômade), apontando duas armadilhas: a “utopia celebratória” e o “fetiche do novo” que, muitas vezes, é uma “requalificação do velho”, como alertou o advogado e blogueiro.  Se o capitalismo sempre funcionou em redes, o que muda nos nossos relacionamentos? A maior velocidade da informação e a conectividade formam malhas sociais diferentes, assim como a capacidade de transitar no tempo e no espaço, configurando, para ele, “uma transformação antropológica significativa nos modos de usar esses dispositivos em rede”.

Cava ressaltou a importância dos movimentos sociais, pelo significado que assumem na ”produção de subjetividade como unidade de ação política”, pontuando que este significado é assumido na “tensão do real”, justamente onde está a subjetividade, ou “ponto de vista onde se atua”. “Fazer cultura é fazer política”, enfatizou, mas fazer cultura, que é também fazer política,  não pode ser “protecionista”, por isso mesmo, é preciso “reconhecer a potência dos movimentos, para além da proteção dessas culturas”, ou seja, sua “imanência ou a implicação deles nas formas de vida”. Reconhecer a construção dos sentidos para a vida coletiva exatamente onde acontece a produção de cultura nos dias atuais: em redes sociais que aliam ações nas ruas e internet, onde a criatividade difusa gera saberes.

Fábio Malini (Ufes), que pesquisa como ocorre o  ativismo de dados em redes digitais questionou: Como podemos ler essas manifestações a partir do volume elevado de dados, diversos atores (humanos e não humanos) e grande velocidade das redes? Exemplo de como estes estudos podem revelar perspectivas esclarecedoras sobre a  cultura hoje é acompanhamento do fenômeno chamado pela mídia de ”vandalismo” e suas relações construídas de forma controversa na rede. “Grupos diversos atuam com posições bem marcadas”, afirmou Malini. O professor também enfatizou a centralidade do afeto e das expressões estéticas, fator importante quando se pensa, especialmente, na “viralização da rede”, processo que expande as conexões físicas e digitais, por meio da ação de seus integrantes.

“Me parece que vivemos um momento de quebra de silêncio de determinadas redes. O sujeito se constitui no processo do sujeitos de narrar esses eventos. O modo como o perfil opera na rede desoculta aquele que fala, revela a condição de estar em situação de franqueza”. O pesquisador apontou a diversidade  cultural, humana e tecnológica atuante em um campo político no qual, entretanto, a visão antropocêntrica acaba por constituir o pensamento clássico que conforma nossos valores, atitudes e comportamentos. Mas, afinal, provocou Malini: quantos dizem no ambiente da rede? “A força de uma ação coletiva na rede é proporcional à variedade de pensamentos minoritários que ela consegue  aglutinar”.  E quem diz? “O perspectivismo de redes interpreta relações entre e intracoletivos humanos e não humanos em redes complexas”.

Mídias, espaços públicos e individualidades

Marcio Serelle, Geane Alzamora, Sérgio Amadeu e Paulo Silva debatem as transformações culturais e políticas do espaço público

Marcio Serelle, Geane Alzamora, Sérgio Amadeu e Paulo Silva debatem as transformações culturais e políticas do espaço público

Mediada por Márcio Serelle (Puc Minas), o debate do dia 23 de maio encerrou a programação, com o tema “Recombinações e reconfigurações no campo midiático: Espaços públicos e individualidades”. Paulo Celso da Silva (Uniso) lembrou a importância da noção do cotidiano, com o professor e geógrafo Milton Santos: a noção de “emoração”, ou a relação entre emoção e razão que encontra seu fundamento nas trocas simbólicas, realizadas no espaço urbano contemporâneo. Silva analisou as transformações da comunicação nas chamadas “smart cities”, cidades nas quais  os usos sociais das tecnologias comunicativas, associadas à busca do equilíbrio ecológico, alteram profundamente a vida social, modificando hábitos e valores.

Desta forma, a relação estreita entre espaço urbano, tecnologia e experiência cotidiana recebe atenção crescente dos estudos que pensam a geografia como construção do espaço humanizado. As formas de adesão ou resistência a essas novas maneiras de vivenciar o cotidiano variam conforme as culturas e os modelos sociais, de acordo com as gerações, como enfatizou o professor, mas uma coisa é certa: as novas tecnologias vieram pra ficar e ainda vão influenciar muito as mudanças na vida nas cidades de todo o mundo, ao alterarem o modo como as relações sociais desenvolvem-se no espaço e no tempo.

Sergio Amadeu da Silveira (UFABC) observou, por sua vez, as recombinações e reconfigurações típicas das práticas remix que, por meio da tecnologia, singularizam a cultura digital. Ao misturar, interpretar e recriar conteúdos disponíveis na rede, os  usos sociais da tecnologia transformam sensibilidades e a valores, colocando no centro do debate a autoria desses conteúdos, bem como confrontam a potência da criação coletiva aos processos de vigilância e controle das conexões, através das quais estes conteúdos políticos espraiam-se na rede.

Geane Alzamora (UFMG), por sua vez, afirmou que a cobertura internacional dos protestos que demarcam a vida política hoje tem sido feita, de modo geral, por uma cobertura cidadã. Segundo ela, estamos diante do apogeu da chamada crise das representações, com forte crítica à imprensa, como ocorreu com a rede Globo durante os protestos no Brasil. A maior emissora de televisão do país precisou, inclusive, esconder seus microfones para fazer a cobertura jornalística nas ruas. A professora destacou, ainda, a importância política adquirida por uma visibilidade midiática expandida que tensiona o poder das instituições, borra os limites do público e privado e viabiliza a constituição do público, fundamentalmente, por meio de ocupações urbanas que integram ruas e redes digitais.

VII-Seminario-01

Promovido pelo Observatório da Diversidade Cultural, o seminário efetivou a parceria com o Grupo de Pesquisa Diversidade Cultural e Midiática (CNPq) e o Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PUC Minas). O VII Seminário da Diversidade Cultural teve o patrocínio da Vale e parceria do Programa multidisciplinar de pós-graduação em Cultura e Sociedade (UFBA), Rede U-40 Brasil e Memorial Minas Gerais Vale. Apoiaram o evento: Instituto Itaú Cultural, Circuito Cultural Praça da Liberdade, Ministério da Cultura e Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte.

Desde 2005, o Seminário já tratou dos seguintes temas:

Diversidade Cultural – o debate internacional para sua preservação (2005);

Educação, Desenvolvimento, Música e Dança (2007);

Ações para Proteção: políticas públicas, gestão e comunicação (2008);

Entendendo a Convenção da Diversidade (2009);

Promovendo diversidade, superando desigualdades (2010);

Comunicação, educação, criatividade e diversidade cultural (2011).

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