Foto: Carolina Maria Soares Lima
Por Carolina Maria Soares Lima [1]
Durante o ano de 2019, realizei minha pesquisa de conclusão de curso de graduação em Geografia analisando as transformações do espaço público na Rua Sapucaí, no bairro Floresta, em Belo Horizonte. Logo em seguida, em 2020, ingressei no mestrado, também no Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais e venho, desde então, desenvolvendo uma pesquisa ao redor da temática da arte de rua em diferentes contextos urbanos da América Latina. Na pesquisa de conclusão de curso já havia começado a perceber o papel da cultura em diversas linguagens para a transformação do espaço. Desde a gastronomia, passando pelos festivais de música e a arte de rua: as manifestações culturais cumprem um papel de fundamental importância na produção e na reprodução do espaço urbano na contemporaneidade.
Agora, em meu mestrado, sou orientada pela professora Heloísa Costa e coorientada pelo professor Sérgio Martins, que me acompanha desde a graduação. A princípio, nesta pesquisa, percorri por uma longa revisão bibliográfica sobre as manifestações visuais na cidade, abrindo um escopo de possibilidades para a pesquisa. Explorei desde o papel do muralismo mexicano, com Diego Rivera, e os murais de Cândido Portinari, passando pela digressão histórica até as lutas de Maio de 68 até chegar aos debates mais contemporâneos sobre a arte de rua. Dessa forma, estabeleci o que realmente me interessa na pesquisa: um desdobramento da temática das expressões visuais nas metrópoles contemporâneas, desde esculturas, graffitis, pixo, passando pelos próprios edifícios, pontes e viadutos e até mesmo a cidade.
No presente momento, a pergunta central da pesquisa é “Como se relacionam as obras de graffiti, mural e pixo à (re)produção social do espaço em diferentes contextos urbanos?” e são utilizadas três cidades latinas para a análise e construção dos argumentos e hipóteses. Para compreender melhor e responder à pergunta que coloco mais à frente, utilizei os casos da cidade de Medellín, na Colômbia, mais especificamente na Comuna 13, e os casos da cidade de São Paulo e da cidade de Belo Horizonte, mais especificamente focada nos casos de perseguição à arte no Circuito Urbano de Arte.
No contexto da pandemia da COVID19, realizar pesquisas no âmbito da cultura é um desafio profundo. Em outro grupo de pesquisa que faço parte, realizamos uma pesquisa sobre a percepção do espaço a partir de diferentes pontos de vista, estabelecidos a partir da fé e da religião. Nesse outro trabalho, tive a oportunidade de desenvolver uma pesquisa através do snowball method, que permite encontrar diferentes agentes através de indicações de outros agentes para a obtenção de dados qualitativos. Através de alguns poucos contatos nas três cidades, venho estabelecendo uma forte rede de contatos para proverem os dados necessários para a pesquisa através de entrevistas e grupos focais para a construção das narrativas ao redor dos casos de análise.
Até o momento, algumas descobertas interessantes são importantes destaques e contribuições para o âmbito das discussões acerca da diversidade cultural. A primeira delas é que a arte de rua guarda em si um potencial de dissenso, ou seja, de romper, politicamente, com as ordens impostas. A segunda delas é que muitos artistas de rua são perseguidos e criminalizados devido a suas origens no espaço público urbano, ou seja, grupos marginalizados e subalternizados são alvo de perseguições, como o que ocorreu no início de 2021 com um dos murais do Circuito Urbano de Arte. A terceira delas é que a arte de rua narra o cotidiano e a realidade dos moradores das periferias urbanas, apresentando e denunciando, aos moradores das cidades os resultados do processo excludente da produção do espaço.
Adentrando a segunda metade do programa de mestrado, ainda não há muitos resultados da pesquisa que possam ser compartilhados, mas os avanços nas análises dos casos da cidade de Medellín merecem um destaque, que compartilho com vocês e pode ser melhor explorado nos anais do IV Simpósio Nacional sobre Patrimônio e Práticas Culturais com o título: ENTRE O CONCRETO E OS OLHOS: MEMÓRIA PRESENTIFICADA NA ARTE – A COMUNA 13 EM MEDELLÍN. No resumo expandido apresentado neste simpósio pude apresentar um excerto desta pesquisa de mestrado em curso. Nele, lancei meu olhar para diferentes pontos de vista sobre as obras de arte de rua na Comuna 13 em Medellín, possibilitados por uma visita em campo, realizada em 2018 e um relato de história oral de um morador da comuna.
A Comuna 13 é uma favela situada em Medellín, que durante muito tempo, foi considerada uma das cidades mais perigosas do mundo, tendo a Comuna 13 como uma das mais perigosas da cidade. Contudo, hoje, a realidade de Medellín da Comuna 13 é outra: turistas visitam a comuna para admirar os muros que contam a história local, recebendo turistas de todo o mundo para fazer o que é conhecido por grafittour. Os muros da Comuna são cobertos por pinturas que contam a história do bairro e dos moradores, tendo estes como os heróis das narrativas destas pinturas, como é o exemplo da figura 1.
Verifiquei, ao longo da análise do caso da Comuna 13, um caráter ativista na arte de mural das ruas de Medellín uma vez que promovem agitação e propaganda, conectando, portanto, a arte e a política. Isso se justifica pelo fato de que são capazes de evocar a memória, promovendo um posicionamento capaz de agir na realidade material do lugar, preservando o bairro e promovendo o senso de lugar. As obras, ainda, não apenas evocam a memória, mas são responsáveis pela consolidação de uma identidade e uma memória coletivas locais.
Realizar pesquisas no âmbito da geografia cultural e dos estudos do espaço em um contexto de isolamento social é extremamente desafiador. As telas não permitem captar todos os sentidos que a vivência dos fenômenos nos possibilita. Esta dificuldade e desafio foram a maior motivação para colaborar com o relato de pesquisa, uma vez que sei que há diversas pessoas em situações extremamente parecidas com as minhas. Continuemos!
[1] Carolina Maria Soares Lima / Geógrafa, mestranda em Geografia na Universidade Federal de Minas Gerais, membro do Observatório da Diversidade Cultural e do Postsecular Architecture Research Network.
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