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O futuro que queremos integra a cultura

AGENDA 21

 

O Boletim da Agenda 21 da Cultura publicou o texto abaixo sobre a inclusão da cultura nos objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS).

A Cúpula especial dedicada à adoção do programa de desenvolvimento pós-2015, que se reuniu em Nova York de 25 a 27 de setembro, durante a 70º sessão regular da Assembleia geral das Nações unidas (UNGA 70), adotará o documento final “Transformar nosso mundo: o Programa de desenvolvimento sustentável no horizonte 2030”. Esse documento, que traz 17 objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) e 169 metas, servirá como guia para as políticas e estratégias de desenvolvimento sustentável para os próximos 15 anos.

Desde 2013, a campanha mundial “O futuro que queremos integra a cultura”, promovida por diversas redes regionais e internacionais da sociedade civil, pediu pela inclusão da cultura no documento final dos ODS. A Declaração, traduzida em oito línguas, foi assinada por 900 organizações e por milhares de cidadãos de 120 países, prova de seu alcance universal.

Enquanto os dirigentes do mundo se preparam para adotar o documento final dos ODS, os membros da campanha “O futuro que queremos integra a cultura” publicam este comunicado para apresentar as seguintes observações:

  1. Resultados

O processo que levou à adoção de transformar nosso mundo, em forma de amplas consultas, implicando os atores da sociedade civil em escala regional, nacional e local, é importante. Uma comunidade mundial conseguiu discutir sobre sua visão do desenvolvimento sustentável no âmbito de um amplo fórum aberto a todas as partes implicadas. Esse tipo de processo participativo deveria ser aplicado no futuro, pelo menos na preparação dos planos nacionais de desenvolvimento decorrentes da agenda 2030.

Comparado aos Objetivos do milênio para o desenvolvimento, Transformar nosso mundo representa um progresso significativo para o reconhecimento do papel da cultura nos processos de desenvolvimento. Os elementos seguintes são dignos de menção:

  • O preâmbulo faz referência à necessidade de respeitar a diversidade cultural (parágrafo 8) e conclama os Estados membros a apoiar o diálogo intercultural, a tolerância e o respeito mútuo, ao mesmo tempo em que fortalece a diversidade natural e cultural do mundo e reconhece que todas as culturas e civilizações podem contribuir para o desenvolvimento sustentável e são facilitadores essenciais dele (parágrafo 36). Outros aspectos apontados no Preâmbulo, como a visão de um mundo no qual todos saibam ler, escrever e contar (parágrafo 7) são fatores determinantes para o acesso à cultura e a promoção do diálogo intercultural.
  • A meta 2.5 faz menção à necessidade de assegurar um compartilhamento justo e equitativo dos benefícios que decorrem da utilização de recursos genéticos e saberes tradicionais a eles associados, com o objetivo de alcançar o objetivo de eliminar a fome e de alcançar a segurança alimentar etc.
  • A meta 4.7 afirma a necessidade de uma educação que promova a cultura da paz e da não-violência, a cidadania mundial, a apreciação da diversidade cultural e a contribuição da cultura para o desenvolvimento sustentável.
  • A meta 8.3 propõe que a criatividade e a inovação sejam encorajadas por meio de políticas de desenvolvimento associadas a atividades produtivas, empregos decentes e o empreendedorismo.
  • As metas 8.9 e 12.b referem-se à necessidade de conceber e aplicar políticas que promovam o turismo sustentável, inclusive sobre a cultura e os produtos locais, e à necessidade de desenvolver instrumentos de controle de impacto sobre o desenvolvimento sustentável.
  • A meta 11.4 afirma a necessidade de fortalecer os esforços para proteger e salvaguardar o patrimônio cultural e natural mundial, sob o objetivo 11, que visa a fazer com que as cidades e os estabelecimentos humanos sejam abertos a todos, seguros, e sustentáveis.
  • A meta 16.4 refere-se à necessidade de fortalecer a recuperação e restituição dos bens roubados, enquanto que a 16.10 visa a garantir o acesso público à informação e a proteger as liberdades fundamentais, o que deverá implicar o reconhecimento da importância das bibliotecas.
  1. Lacunas

Entretanto, os dirigentes da campanha “O futuro que queremos integra a cultura” continuam preocupados com o fato de que o documento final falhe no reconhecimento pleno e na afirmação da importância da cultura para o desenvolvimento sustentável. Como foi sistematicamente apontado pela campanha, em diversos documentos, a cultura é um motor e facilitador de desenvolvimento sustentável. A cultura é uma das quatro dimensões do desenvolvimento sustentável, e é tão essencial quanto as dimensões econômicas, sociais e ambientais. Uma abordagem holística e integral do desenvolvimento só poderá ser realizada se os valores de criatividade, patrimônio, conhecimento e diversidade forem integrados a todas as ações de desenvolvimento sustentável. Isto implica a garantia da disponibilidade e da acessibilidade das infraestruturas culturais (alguns exemplos não exaustivos são as bibliotecas, os museus, teatros, centros comunitários e centros de educação artística) e a implementação de programas e projetos culturais a longo prazo.

Apesar do documento “Transformar nosso mundo” integrar algumas referências às dimensões culturais, ele falha ao não levar em consideração as provas reunidas pela comunidade internacional ao longo das duas últimas décadas quanto ao papel positivo da cultura para o desenvolvimento. Neste sentido, a cultura é explicitamente mencionada em apenas quatro das 169 metas que compõem os ODS.

Finalmente, não há nenhuma garantia de que a agenda do desenvolvimento pós-2015 será financiada adequadamente. De acordo com as estimativas da ONU, 11,5 trilhões de dólares por ano serão necessários para alcançar os novos objetivos. A CNUCED [Conferência das Nações Unidas sobre o comércio e o desenvolvimento] estima que o total dos investimentos necessários nos países em desenvolvimento situa-se entre 3,3 e 4,5 trilhões de dólares por ano, o que, comparado aos investimentos atuais, representa um déficit anual de 1,9 a 3,1 trilhões.

  1. Próximas etapas

A campanha “O futuro que queremos integra a cultura” definiu uma nova agenda mundial para a cultura, reunindo e apresentando – pela primeira vez – a visão comum dos povos e da sociedade civil sobre a importância da cultura para o desenvolvimento sustentável. Esse tipo de iniciativa internacional continua sendo necessário para continuar a clamar pela inclusão da cultura nos marcos legais e nas estratégias de desenvolvimento, para agir como vigia, sensibilizar e organizar iniciativas e perspectivas locais, nacionais e regionais.

Consequentemente, os membros da campanha pretendem dar prosseguimento a sua ação, da seguinte maneira:

  1. A) Encorajaremos a inclusão das dimensões culturais nos planos nacionais de desenvolvimento, nos mecanismos internacionais de cooperação e em outra estratégias e políticas decorrentes de “Transformar nosso mundo”. Acreditamos que referências à cultura devem ser feitas ao mesmo tempo nas metas do documento final, nas quais a cultura é mencionada, mas também nas outras metas nas quais a dimensão cultural está implícita. Acreditamos firmemente que os processos que serão propostos para implementar “Transformar nosso mundo” deverão sistematicamente incluir atores do meio cultural.
  2. B) Pedimos a inclusão de referências à cultura que sejam realmente operacionais, durante as grandes conferências internacionais em que será discutida a implementação dos ODS, incluindo a Conferência da ONU sobre as mudanças climáticas (COP21, Paris, dezembro de 2015) e a Conferência da ONU sobre o habitat e o desenvolvimento urbano sustentável (Habitat III, Quito, outubro de 2016).
  3. C) Acreditamos que a campanha a favor da cultura no desenvolvimento sustentável deve ser reforçada por uma pesquisa baseada em dados factuais e indicadores. É necessário ter indicadores confiáveis e inclusivos para mensurar o alcance das metas que fazem menção à cultura. Queremos contribuir para a concepção de indicadores culturais e de sistemas de dados que permitirão uma melhor compreensão e uma mensuração, quantitativa e qualitativa, do lugar da cultura no desenvolvimento sustentável.
  4. D) Buscamos ocasiões de apresentar de modo convincente e inspirador as provas do papel da cultura para o desenvolvimento em fóruns internacionais que tenham uma gama extensa de disciplinas, fora do setor da cultura, com o objetivo de sensibilizar, favorecer a compreensão, estabelecer pontes e desenvolver parcerias.
  5. E) Acreditamos que novas parcerias com as organizações da sociedade civil, as autoridades públicas, as agências da ONU, as organizações intergovernamentais regionais, as redes internacionais, o setor privado e as outras partes implicadas são necessárias, mais do que nunca, a fim de estender a tomada de consciência do papel essencial da cultura para o desenvolvimento sustentável.
  6. F) Buscaremos desenvolver uma estratégia apoiada nas ações realizadas até hoje, mobilizando recursos e fortalecendo as relações que permitirão o prosseguimento da campanha internacional, e comunicando eficazmente com todas as partes implicadas. Convidamos todos os signatários da campanha, e os demais, a continuar a colaborar com esses esforços e com qualquer outra iniciativa que contribuirá para fazer com que o futuro que teremos integre a cultura.

Abaixo assinados, 23 de setembro de 2015

– Sra. Sarah Gardner, Diretora-Geral, IFACCA; s.gardner@ifacca.org

– Sr. Jordi Pascual, Coordenador, Agenda 21 da cultura – CGLU; coordination@agenda21cultura.net

– Sr. Charles Vallerand, Secretário-Geral, FICDC; cvallerand@cdc-ccd.org

– Sra. Mercedes Giovinazzo, Presidente, Cultura Action Europe; mgiovinazzo@interarts.net

– Sra. Silja Fischer, Secretária-Geral, Conselho Internacional da Música – IMC;

– s.fischer@imc-cim.org

– Sr. Peter Rorvik, Secretário-Geral, Rede Arterial; peter@arterialnetwork.org

– Sra. Kirsti Kovanen, Secretária Geral, Conselho Internacional dos Monumentos e Sites ICOMOS; secretariat@icomos.org

– Sra. Donna Sheeder, Presidente, Federação Internacional das Associações das Bibliotecas e instituições – IFLA; donna_sheeder@comcast.net

– Sra. Patricia Kistenmacher, Rede Latino-americana das Artes para a Transformação Social patricia.kistenmacher@gmail.com

 

*Texto publicado originalmente no site www.agenda21culture.net

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